3 de junho de 2009

Antonio Gramsci - da prisão do além-túmulo - colabora com Manufactura Suspeita

Não é o Paroni que inventa moda





“Sabe que eu, bem antes de Adriano Tilgher, descobri e contribuí a popularizar o teatro de Pirandello? Escrevi sobre Pirandello, de 1915 a 1920, tanto a ponto de juntar um volumezinho de 200 paginas. As minhas afirmações eram originais e sem exemplos, então: Pirandello era suportado amavelmente ou derriso abertamente.” (Escrito da prisão para a cunhada Tatiana, em 19 de março de 1927)


Antonio Gramsci (1891-1937), grande cientista político comunista e antifascista italiano, foi também critico teatral do “Avanti!” de Turim por quatro anos, de 1916 a 1920. Abaixo, um trecho significativo de uma das criticas sobre Pirandello - exatamente como o Manufactura trabalha seus textos:

[...] a personalidade artística de Pirandello é multifacetada e complexa. Quando Pirandello escreve um drama, ele não se exprime “literariamente” com a palavra, [esta] um aspecto [somente] parcial de sua personalidade artística. Ele “deve” integrar a escrita literária com a sua obra de capocomico e diretor. O drama de Pirandello atinge toda a sua expressividade somente quando a “atuação” será dirigida pelo Pirandello capocomico, ou seja, na medida em que Pirandello terá suscitado nos atores uma determinada expressão teatral e na medida em que o Pirandello diretor terá criado uma determinada relação estética entre o complexo humano que atuará e o aparato material do palco (luzes, cores, direção em sentido amplo). Ou seja, o teatro pirandelliano está estritamente ligado à personalidade física do escritor e não somente aos valores artístico-literários “escritos”. Uma vez morto Pirandello (quer dizer, se além do escritor, não mais opera o capocomico ou o diretor), o que sobra do teatro de Pirandello? “um canovaccio genérico” que, em certo sentido, pode lembrar o fundo de cena do teatro pré-goldoniano, dos “pretextos” teatrais, não da “poesia” eterna. Dir-se-ia que isso ocorre em todas as obras para teatro, o que, em certo sentid,o é verdade. Mas somente em certo sentido. È verdade que uma tragédia de Shakespeare pode ter diversas interpretações teatrais segundo os capocomicos e os diretores; quer dizer, é verdade que cada tragédia pode virar “pretexto” para espetáculos teatrais diferentes entre si. Mas resta que a tragédia “impressa” no papel e lida individualmente tem uma vida artística independente, que pode se abster da representação teatral: é poesia e arte também fora do teatro e do espetáculo. Isso não acontece com Pirandello: o seu teatro vive esteticamente em sua maior substância somente se “representado” teatralmente tendo Pirandello como capocomico ou diretor. (tudo isso seja entendido com muito cuidado).
Antonio Gramsci – Cadernos do Cárcere – Literatura e Vida Nacional – Ed Riunti, Roma - tradução Mauricio Paroni de Castro